BROKER – UMA NOVA CHANCE | UM DRAMA FAMILIAR EM QUE NADA É O QUE PARECE SER

No Brasil, até o começo dos anos 50 existia um objeto conhecido como “roda dos excluídos” ou “roda dos enjeitados”, espalhado em Santas Casas, Igrejas e Instituições de Caridade, que consistia num dispositivo em que se colocavam os bebês que, por qualquer motivo, fossem “abandonados” pela família. Eles eram colocados anonimamente do pelo lado de fora do local e a roda os colocavam para o lado de dentro, onde seriam cuidados. Enquanto aqui no Brasil isso é uma coisa do passado, na Coreia do Sul ainda é uma realidade, lá esses objetos são chamados de “caixa de bebê”, mas funcionam da mesma forma.

“Broker – Uma Nova Chance” começa com a jovem Moon So-young (Ji-eun Lee) colocando seu filho em frente a uma dessas caixas, ela deixa nele um bilhete com o nome do bebê e dizendo que voltaria para buscá-lo. Porém, antes que o bebê fosse resgatado pelo “outro lado”, um dos funcionários, Dong-soo (Gang Dong-Won), pega o bebê e apaga todos os registros das câmeras de segurança, expondo um esquema em que ele, junto com seu amigo Ha Sang-hyeon (Song Kang-ho), sequestram esses bebês para vende-los.

Assim como o conceito de uma “caixa de bebê”, em “Broker” nada é apenas uma coisa ou outra. Tanto os personagens quanto as situações em que são inseridos estão constantemente numa área cinzenta em que tudo é relativizado e correlacionado, o que nos leva a ter empatia com todos as partes envolvidas, ou pelo menos com a maioria delas. A mãe que abandona seu filho realmente volta para buscá-lo e acaba se envolvendo com os homens que pretendem vender o bebê e a convencem de que essa é a melhor opção para o futuro da criança. Os homens que traficam bebês abandonados não são o que se espera de traficantes, os dois têm cuidado com os bebês (vale ressaltar também que a adoção ainda é um estigma na Coreia do Sul), tentam levar a vida como conseguem, um deles tendo sido ele mesmo um bebê abandonado por uma mãe que prometeu voltar, mas nunca voltou.

Uma vez que estão na mesma página, o trio começa sua busca pelo casal ideal para vender o bebê, enquanto duas policiais descobrem o esquema e seguem em seu encalço na tentativa de pegá-los em flagrante. O papel da polícia e da assistência social são questionados a partir do prisma da humanidade versus o cumprimento cego da lei. A relação entre os quatro já traz uma delicadeza e críticas sutis, mas potentes, em relação às desigualdades da sociedade e ganha um novo nível de sensibilidade quando, acidentalmente, um menino órfão com o sonho de ser adotado, se junta a eles nessa jornada.

O cinema coreano é especialmente eficaz nesse tipo de crítica e “Broker” não é uma exceção, mas muito mais do que “apenas” criticar, o filme realmente nos ganha na profundidade de seus sentimentos e das complexidades de seus personagens. As individualidades de cada um, que são fatores que os isolam na sociedade, acabam os aproximando ao ponto de criarem sua própria família disfuncional e sonharem, pela primeira vez, com uma possibilidade de futuro em que não estão sozinhos. Nenhum deles é absolvido de seus erros completamente, mas lidam de formas diferentes com os resultados de suas ações e das suas prioridades. Num mundo que nunca lhes ofereceu qualquer afago, encontram durante a jornada, afeto entre eles mesmos e para eles mesmos. Sem julgamentos e com bom humor, “Broker” traz uma história para emocionar a todos e fazer com que possamos nos relacionar com os personagens ainda que não concordemos com suas atitudes.

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