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Há 19 anos, M. Night Shyamalan escutou de estúdio e críticas sobre o quão Corpo Fechado era um filme errado, principalmente por tratar sobre quadrinhos e super heróis em uma época em que o tema não era pop. O passar do tempo provou o quanto a obra merecia sim seu espaço entre os personagens da Marvel e da DC, tanto que Shyamalan enxergou a oportunidade de lançar sua sequência 16 anos depois após o primeiro filme.

E então, chegamos na conclusão extraordinária de uma trilogia corajosa o suficiente para mostrar uma visão madura e honesta sobre um universo pautado na infantilidade e, muitas vezes, futilidade.

Mesmo depois de 19 anos passados, ainda é incompreensível a desaprovação em cima de Corpo Fechado. A construção narrativa de Shyamalan está no mesmo nível – ou até superior – ao filme antecessor, que colocou o diretor nos holofotes: O Sexto Sentido (1999). A superioridade do longa de 2000 sobre o queridinho do público está justamente na arma que o indiano criou para seu estilo.

O Sexto Sentido é um filme que funciona uma vez só, já que, após a revelação, ele perde “sua força” principal, enquanto a virada do filme de 2000 ainda se mantém intacta atualmente, provocando discussões sobre várias variações de temas. Além do controle narrativo esplêndido do diretor ao trabalhar tensão, suspense e ação como o cinema não estava acostumado, adotando um perfil mais mundano daquilo que seria extraordinário.

O mesmo ocorre com Fragmentado (2016), com um pouco mais de avanço devido a primorosa atuação de James McAvoy – esnobado nas premiações passadas, desmerecidamente. Shyamalan manteve seu potencial ao adotar mais um super-humano ao seu universo, desenvolvendo não só um, mas 24 personagens que compõem um único ser. E em Vidro, o diretor uniu suas aptidões para um conclusão no mesmo nível dos dois anteriores, quiçá, superior.

A continuidade da história de Shyamalan eleva sua paixão por quadrinhos, como também sua maturidade na direção. Mesmo após os dez anos da Marvel estabelecerem uma linguagem única para filmes de super heróis, o indiano manteve-se maduro em sua proposta e na sua essência de direção. Vidro representa o modo como Shyamalan enxerga o universo dos quadrinhos e de uma maneira muito original, focada diretamente ao audiovisual, realizando tudo com muito esmero na construção de um final – ou quase isso – de uma história heroica como é a trilogia.

As qualidades do diretor vão desde sua construção narrativa da trama e dos personagens até a direção de arte. Aliás, muito bem trabalhada pelo indiano ao estabelecer as cores dos personagens – trazendo mais uma essência importante dos quadrinhos – como também construir narrativamente através dessas cores.

Além de vivas, as três – sendo verde para Dunn, amarelo para Kevin e roxo para Elijah –  conversam com cada personagem em suas próprias construções, principalmente com a situação do personagem de Samuel L Jackson, que é o principal foco da conclusão. Diretamente ligada ao misticismo, magia e mistério, o roxo é predominantemente presente no longa, reforçando a presença misteriosa e poderosa do personagem dentro da narrativa. Esse estabelecimento de Shyamalan à história mantém a comprovação do cuidado do diretor em fazer aquilo que ele acredita ser o certo para a conclusão do seu universo.

Indo além da direção de arte, o cuidado do diretor em construir tensão e fazer a história caminhar por si só é primorosa. Seus movimentos de câmera cuidadosos fazem tudo ser visualmente lindo. O cuidado em trabalhar longos planos para explorar a evolução do roteiro e dos personagens é claro em tela, colocando ainda mais primor em cada um dos cortes e dos sutis movimentos para fazer tudo aquilo ter algum sentido.

Essa exploração acontece ainda mais com McAvoy, que repete o brilhantismo de Fragmentado, com suas sutilezas mudanças de personalidade, sem qualquer pausa. A falta de nítidas diferenças entre as personalidade faz da atuação do britânico ainda mais impressionante, já que cada mudança de personagem funciona através da sutileza, tanto de voz quanto de trejeitos e ideologias – característica essa muito marcada por Christopher Reeve, em Superman (1978).

A escolha de Shyamalan em abusar de McAvoy como Hedwig – sua personalidade mais infantil – é cansativa, até pelo fato do espectador querer ver mais dos outros personagens. Porém, o fato de Hedwig ser inocente em relação ao mundo é um fator importante para manter a Horda viva sobre a realidade que a personagem de Sarah Paulson tenta impor aos personagens heróis.

Nisso, vemos que mesmo “errando”, Shyamalan consegue impor uma justificativa plausível para sua escolha, algo que acontece também na conclusão do longa. No entanto, falaremos disso daqui a pouco.

Com o foco em Elijah e um destaque significativo para Kevin, Dunn é o personagem menos explorado na trama. Porém, o mesmo já teve essa exploração feita em Corpo Fechado e aqui, é só um avanço do que já foi aproveitado anteriormente, o que aqui é bem feito por Shyamalan, que consegue dar um equilíbrio para Dunn e Kevin antes do filme passar totalmente para Elijah, que é belissimamente interpretado por Jackson, em um terceiro ato de encher os olhos daqueles que ingressaram na narrativa e entenderam a proposta de Shyamalan.

Essa que ele discute de forma bela e poderosa a nossa vontade de sermos super-humanos. Sarah Paulson, interpretando uma psiquiátrica, funciona justamente para elevar sua mensagem. A personagem de Sarah entra como uma divisora em discutir sobre a existência de super-humanos ser real ou se sempre há uma explicação por trás, ou seja, uma diminuição significativa daqueles que fazem o extraordinário, tratando-os como “erros” ou “doentes”.

Trazendo isso para uma análise externa, a temática de Shyamalan não só conversa com o mundo real, fazendo uma representação com a realidade de muitas pessoas que são julgadas como fracas por serem diferentes. Mas também há uma discussão com os próprios quadrinhos, que usavam super heróis para discutir os mesmos assuntos, como foi o caso, principalmente, dos X-Men, durante os anos 60/70.

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Explorar isso de forma séria em uma temática de super herói, faz de Vidro um filme ainda mais maduro do que só tecnicamente. Além de explorar a temática de fé – algo que Shyamalan ama tratar em seus filmes. Mas não só religiosa, Shyamalan explora a fé em nós mesmos e na capacidade dos outros poderem realizar o que desejam ou o que acreditam que possam fazer.

A forma como o roteiro trabalha isso, além de conversar muito com a linguagem explorada nos quadrinhos – incluindo as performances de Anna Taylor-Joy, Spencer Treat Clark e Charlayne Woodard como os sidekicks perfeitos para os personagens – e também com uma sutileza e humanidade que deixa toda a conclusão da trilogia ainda melhor do que o esperado.

O que faz de Vidro não só uma obra extraordinária, como também reflexiva, é sua compaixão em discutir temas que os quadrinhos sempre exploraram, mas que no cinema, foram ofuscados com a fórmula pronta do entretenimento.

No entanto, por mais que Vidro seja primoroso em sua temática e direção, o roteiro acaba não sendo perfeito em pontos específicos da trama. A fama de Shyamalan, além de direcionada para seus plot twists, também está em sua escrita, sempre com um roteiro bem apresentado e perfeitamente montado. Entretanto, Vidro peca em não trazer, em partes, essas qualidades do cineasta.

Isso ocorre principalmente durante as viradas do longa. No decorrer das revelações, é nítida a leve forçada que Shyamalan dá para os seus pontos trazerem sentido para a trama. A partir da primeira virada, é até interessante como os pontos trazidos pelo diretor. No entanto, ao refletir sobre as escolhas, há um leve sentimento de que aqueles acontecimentos foram colocados depois, ou seja, não necessariamente tudo foi pensando.

E isso, certas vezes diminui algumas discussões que Shyamalan apresentou em primeiro plano. Inclusive, são essas as principais justificativas que analiso para a má classificação do longa internacionalmente. Os pontos novos não são essencialmente ruins e totalmente desconexos com sua proposta, inclusive, há viradas que foram bem construídas, no entanto, outras passam o sensação de serem forçadas e excluem uma discussão mais madura sobre o cenário.

Mas são detalhes que estão longe de apagar o amadurecimento do cenário de super heróis que Vidro apresenta, com um discurso lindo sobre acreditar no próprio potencial, mas também o dos outros. Isso faz da conclusão de Shyamalan uma obra única e original, provando que o tema super herói pode ultrapassar o entretenimento ao explorar temas sóbrios sobre nossa humanidade e sobre ser humano.

Isso só dá méritos na exploração do gênero dos quadrinhos, inclusive em seus tons genéricos, o que serve como justificativa para alguns “erros” da narrativa – lembra quando disse lá atrás que, mesmo errando, ele entrega justificativas plausíveis? Então.

Vidro, portanto, é uma obra que, mesmo dividindo espectadores e críticas atualmente, servirá como um exemplo ao gênero no futuro. Principalmente devido sua inteligência ao conversar com os espectadores sobre o necessário, sem se utilizar de fórmulas padrões e prontas de entretenimento, fazendo um cinema maduro que ainda é ofuscado pelas narrativas simples e infantis.

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