7.5/10

Fale Comigo

Diretor

Danny Philippou e Michael Philippou

Gênero

Terror

Elenco

Sophie Wilde, Alexandra Jensen, Joe Bird

Roteirista

Danny Philippou e Bill Hinzman

Estúdio

Diamond Filmes

Duração

95 minutos

Data de lançamento

17 de agosto de 2023

Um grupo de amigos descobre uma mão embalsamada que lhes permite conjurar espíritos. Viciado na emoção, um deles vai longe demais e abre a porta para o mundo espiritual.

O filme começa com um caso de um menino aparentemente perturbado e o irmão procurando por ele numa festa quando uma tragédia acontece. Primeira morte na cena de abertura: check.

Mia (Sophie Wilde) é uma adolescente que perdeu a mãe recentemente e só agora está começando a sair do luto. Ela mora com o pai, mas o relacionamento dos dois ficou abalado com o falecimento da mãe e Mia se aproximou ainda mais de sua melhor amiga Jade (Alexandra Jensen) e o irmão mais novo dela Riley (Joe Bird), se tornando uma presença constante na casa da família. Trauma: check.

Sendo as adolescentes que são, Mia e Jade ficam sabendo de uma nova brincadeira que está fazendo sucesso nas redes sociais de seus colegas de escola. A escultura de uma mão misteriosa que, supostamente, faz com que a pessoa que a segura entre em contato com espíritos e, depois de dar sua permissão, é possuída. A origem da mão é desconhecida e os diversos rabiscos e assinaturas em sua superfície indicam que ela já passou por muitos grupos de amigos no passado. E, sendo adolescente como são, as “sessões de possessão” são filmadas e compartilhadas no Snapchat e adjacentes. Brincadeiras sobrenaturais com adolescentes imprudentes: check.

“Fale Comigo” é um terror australiano que sabe usar as fórmulas que o gênero do horror tem a oferecer e, nesse caso, ter o sucesso que tem utilizando “clichês” em vez de criar algo inteiramente novo é algo particularmente impressionante. Desde que começou sua carreira em festivais, Fale Comigo conquistou seu certificado de aprovação da crítica no Rotten Tomatoes e logo  ganhou o título de “melhor filme de terror do ano”. É um título forte, mas raramente merecido ao longo dos anos, geralmente usado mais como hipérbole do que como uma descrição justa. É difícil, entretanto, não sair da sessão sem a sensação de ter assistido algo único e realmente especial. Por mais que definir algo como “o melhor” seja subjetivo e de gosto pessoal, é inegável o resultado que Fale Comigo tem em relação a uma das maiores dificuldades do gênero: genuinamente dar medo.

Escrito e dirigido por Michael e Danny Philippou, dois gêmeos youtubers que produzem há anos conteúdos de humor e terror, “Fale Comigo” é o primeiro longa deles, mas a experiência com conteúdo digital traz ao filme uma autenticidade no modo como retrata os jovens e suas redes sociais, com um olhar próximo, mas ainda distante o suficiente para manter a objetividade. Apesar de relevante para a história, em momento algum o filme se rende ao que poderia ser mais óbvio ao mostrar como esse tipo de brincadeira é propagada na Internet. É louvável também a presença sutil da comédia, apenas em momentos pontuais e raramente como alívio cômico, aparecendo de forma natural sem nunca interferir na tensão criada desde os primeiros momentos e que dita o clima do filme como um todo.

O luto e o trauma de Mia, muito bem trabalhados numa performance memorável de Sophie Wilde, a aproxima dos amigos e colegas superficialmente e a distancia de seu pai, criando um isolamento favorável para as situações que desencadeiam os acontecimentos sobrenaturais do filme e a colocando numa posição em que ela é, ao mesmo tempo, vítima e carrasca das situações em que se coloca. Uma dessas relações mais próximas de Mia concentra as maiores tramas do enredo: Riley, o irmão mais novo de Jade, é como um irmão para Mia também e a amizade deles, às vezes mais cheia de cumplicidade do que a relação de qualquer um deles com Jade, é colocada à prova quando Riley é possuído por algo que veio da mão e sua vida passa a correr perigo.

Existe uma conexão clara entre a brincadeira de possessão com a mão e o abuso de drogas. Numa sequência excepcional (uma das melhores do longa), vemos os adolescentes revezando para tocarem na mão e serem possuídos, com a justificativa de sentirem algo excitante e viciante quando são possuídos, mas seguem a regra de limitar a sessão a 90 segundos por vez, caso contrário, a pessoa pode continuar sendo perseguida pelos espíritos que contactou. É um bom gancho para lidar com a situação emocional de Mia e outros paralelos são tratados ao longo do caminho.

O que torna Fale Comigo um filme com potencial para ser escolhido, talvez pela maioria, como melhor terror do ano está na junção de todos os elementos trabalhados, até mesmo os clichês. Os irmãos Philippou são conscientes de tudo que tem em suas mãos e conseguem empregar tanto o enredo, quanto os personagens em sua melhor forma, os complementando com artifícios de susto, do sobrenatural e de sensações reais do dia a dia. Essa consciência de tudo que é e de tudo que quer ser faz toda a diferença. A história sabe como ser sutil, mas também acerta nos momentos que pedem uma agressividade capaz de trazer um frio na barriga de quem assiste. É ainda mais incrível que esse ritmo seja mantido do começo ao fim, com uma conclusão que deixa aberta a possibilidade de uma sequência (tanto que Fale Comigo 2 já foi confirmado pelo estúdio A24), mas que encerra o ciclo de Mia de forma absolutamente satisfatória.

 

Por Júlia Rezende

9.5

Missão cumprida

pt_BR