A Melhor Mãe do Mundo
Diretor
Anna Muylaerte
Gênero
Drama
Elenco
Shirley Cruz, Rihanna Barbosa, Seu Jorge
Roteirista
Anna Muylaerte
Estúdio
+Galeria
Duração
105 minutos
Data de lançamento
07 de agosto de 2025
Em “A Melhor Mãe do Mundo”, Anna Muylaert volta a contar uma história focada na maternidade e nos desafios de se criar filhos sozinha, sob o prisma socioeconômico. Enquanto “Que Horas Ela Volta?” destaca a desigualdade social, “A Melhor Mãe do Mundo” tem como foco a violência doméstica ao mostrar alguns dias conturbados na vida de Gal (Shirley Cruz), uma mulher que tenta se salvar – e salvar os filhos – de um relacionamento abusivo com o marido Leandro (Seu Jorge). O filme começa com uma cena de Gal na delegacia, o rosto machucado, tomando a decisão de prestar queixas contra seu marido, mas com medo das consequências, ela muda de ideia e decide fugir com os filhos ao invés. Ela tira Rihanna (Rihanna Barbosa) e Benin (Benin Ayo) escondidos da casa de Leandro e, sem ter qualquer coisa além de sua carroça, que usa para catar recicláveis – que depois ela vende numa cooperativa. Sem ter uma rede de apoio por perto, o plano é cruzar a cidade com as crianças para chegar até a casa de sua prima, quase sem dinheiro e precisando ignorar as tentativas de contato por parte de Leandro.
A premissa de “A Melhor Mãe do Mundo” segue a mesma de filmes como “A Vida É Bela”, em que um pai cria uma realidade alternativa (e muito mais suportável) para que seu filho não veja a crueldade daquilo que os cerca de fato. Gal conta para Rihanna e Benin que eles vão viver uma aventura e prova a força da maternidade ao mover céus e terras para que elas nunca notem o que estão passando. Com Benin é mais fácil, o menino ainda é inocente o suficiente para não questionar a mãe e se encantar com tudo que há de mais simples, já com Rihanna é complicado, a menina já está chegando perto da adolescência e tem uma noção das coisas como são, inclusive da índole de seu padrasto. Embora se esforce para não demonstrar, o caminho de Gal é extremamente tortuoso, entre falta de dinheiro, de oportunidade e de ajuda, a resiliência de Gal é impressionante, mas compreensível quando se leva em conta que é o bem-estar de seus filhos que está em jogo, assim como uma nova, e livre, vida que está em jogo.
Passando por uma cidade de São Paulo realisticamente cinza e pouco gentil, os dois primeiros atos do filme são mais bem-aproveitados, apesar de não ser uma história necessariamente original, passa emoção suficiente para comover, muito por conta das atuações. Shirley Cruz faz uma mãe implacável com o mundo, mas amorosa com os filhos, mesmo quando todo o resto está em caindo; suas expressões faciais são resolutas e determinadas, mas são equilibradas pelas crianças que, para mim, são o ponto alto do filme, principalmente o pequeno Benin, cheio de autenticidade e emprestando ao personagem uma doçura sincera que mistura atuação com personalidade. Os melhores momentos são aqueles em que os três interagem como família e todo o amor que os une transborda – e convence. O título do filme não poderia ser mais verdadeiro.
O problema, no entanto, é quando o filme se aproxima mais das questões envolvendo violência doméstica e coloca o casal, Gal e Leandro, como centro da trama, depois que Gal chega na casa da prima e as dinâmicas familiares são expostas. Talvez eu tivesse outra visão em relação ao filme se ele tivesse vindo de alguém inserido nesse contexto social, e não por alguém que vê a situação de fora. Os diálogos entre Gal e a prima Valdete (Luedji Luna) refletem um comportamento real – o de aceitar a violência doméstica como algo comum, obrigatório, em qualquer relacionamento entre marido e mulher. É verdade que esse pensamento existe, mas há algo de simplório no modo como as frases são trocadas e o discurso é feito, passando a sensação de que a direção aborda um tom paternalista para falar daquela situação, como quem diz “olha só como eles pensam, eles não têm escolha”. Esse enrolo confuso e pouco convincente dá espaço para um final muito mais otimista, e também idealizado. É uma conclusão bonita e inspirada, ainda que se afaste da realidade ao assumir um tom “milagroso”, e consegue fazer com que a lembrança do filme acabe positiva apesar dos deslizes.
Por Júlia Rezende