
A Verdadeira Dor
Diretor
Jesse Eisenberg
Elenco
Jesse Eisenberg, Kieran Culkin, Olha Bosova
Roteirista
Jesse Eisenberg
Estúdio
Searchlight Pictures
Duração
90 minutos
Data de lançamento
30 de janeiro de 2025
Indicado ao Oscar de Melhor Roteiro Original, “A Verdadeira Dor” é o filme mais “simples” da categoria, e é justamente essa característica que determina o sucesso desse roteiro. O filme, que marca uma viagem entre primos, é também uma viagem na psique de dois personagens que não poderiam ser mais diferentes entre si, mas dividem um passado e algo ainda maior: o luto. No terceiro filme a trazer Jesse Eisenberg como roteirista e diretor, ele parece ter encontrado um equilíbrio entre drama e comédia, não com um humor óbvio, mas com situações tão essencialmente tristes que acabam virando tragicamente cômicas. É também um filme em que Jesse Eisenberg parece deixar sua própria essência mais aparente (A história fictícia é emprestada da história real da família Eisenberg), potencializada pela presença de um personagem tão estranho e profundo quanto a história em si, vivido pela genial Kieran Culkin. É o encontro dessa dupla que faz desse um filme tão especial.
Benji (Kieran Culkin) e David (Jesse Eisenberg) são primos e cresceram juntos, mas a vida adulta os separou ao ponto deles se tornarem praticamente estranhos um para o outro. Eles são opostos, David é controlado, pai de família, tem um emprego “sério” e planeja cada passo que dá. Já Benji é livre, espontâneo e desapegado de tudo. Como vemos a história da perspectiva de David, é nítido o seu desconforto em relação à atitude do primo – ou seu desconforto em relação a tudo, na verdade. É a primeira vez em muito tempo que eles são “obrigados” a conviver. Depois que a avó que eles têm em comum acaba falecendo, eles usam o dinheiro que ela deixou para viajar para a Polônia e conhecer o local onde ela cresceu, berço de sua herança judaica, e onde ela sobreviveu ao Holocausto. Para David ela era “só” uma avó, para Benji, era o amor de sua vida e única pessoa por quem ele acredita ter sido compreendido.
O laço entre os dois, perdido em algum lugar da juventude, dá lugar a uma inveja de ambos, mas por motivos diferentes. Quem realmente brilha é Benji, em todos os sentidos, e parte disso se deve à visão que David tem dele. Benji é uma pessoa indecifrável, imprevisível, por vezes grosseiro em sua atitude desprendida e brutalmente honesta, mas é também magnético e infinitamente fascinante. Ele até pode afastar as pessoas, mas inevitavelmente as atrai de volta, sem parecer fazer esforço. Benji é a atração de qualquer festa – David é… nada disso. Em sua ânsia por ser uma pessoa “apropriada”, ele acabou aceitando não ser nada realmente especial e isso quase nunca o afeta, até ele ser obrigado a ver o charme de Benji em ação. A relação entre os dois anda numa corda bamba, e as discordâncias trazem humanidade (e humor) para o filme.
Em meio a tours em lugares belíssimos e outros a lugares aterrorizantes, como o tour de um campo de concentração, os primos vão descobrindo e explorando seus pontos de divergência e destrinchando novas camadas de expectativas, de tristeza, luto e procura por sua identidade e paz interna. Não é nenhuma surpresa que Benji não seja tão feliz quanto parece ser e que David não tem tanta certeza de tudo. Ainda assim, é emocionante acompanhar a trajetória individual de cada um e da dupla também, perceber as diferenças entre a imagem que os outros têm de nós e a nossa autoimagem. Essas percepções distintas ficam mais evidentes quando eles estão com os outros membros do tour e vemos a forma como terceiros são impactados por David e Benji – e como Benji é capaz de deixar uma marca muito mais profunda, ainda que ele também tenha seus próprios demônios para combater.
Com apenas 90 minutos de duração, “A Verdadeira Dor” faz da dor desses primos, a nossa. É fácil se perder na dinâmica dos dois e na forma como cada um escolhe se mostrar para o mundo. O cenário, e a inserção da reflexão sobre a memória e experiência judaica, só acrescentam, criando uma nova camada nessa história de sentimentos. Não é sempre que um filme consegue ressonar tanto de forma tão sutil, mas é inegável que isso é resultado não só de um roteiro objetivamente esperto, mas também de atuações que devem ser celebradas, principalmente a de Kieran Culkin (vencedor do Globo de Ouro e indicado ao Oscar de Melhor Ator Coadjuvante) que, assim como Benji, conseguiu se transformar num grande protagonista.
Por Júlia Rezende