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Nosso Sonho

Diretor

Eduardo Albergaria

Gênero

Drama

Elenco

Lucas Penteado, Juan Paiva, Nando Cunha

Roteirista

Eduardo Albergaria, Daniel Dias e Mauricio Lissovsky

Estúdio

Urca Filmes

Duração

120 minutos

Data de lançamento

21 de setembro de 2023

“Nosso Sonho” é uma cinebiografia de “Claudinho e Buchecha”, dupla de maior sucesso do funk melody nacional de todos os tempos e ícone máximo do gênero na música brasileira. A história de uma amizade que se transforma em força de superação e conquista. Um filme que mostra como o ritmo e a poesia da periferia conquistaram o Brasil. Uma história real repleta de fantasia. Um musical, emocionante e divertido, feito de drama e tragédias, mas também de humor, surpresas e redenção.

É praticamente impossível encontrar um brasileiro com mais de 20 anos que não conheça a dupla Claudinho e Buchecha. Precursores do funk melody no Brasil, a dupla carioca despontou nos anos 90 e fez um sucesso estrondoso até a morte precoce de Claudinho num acidente de carro que chocou o país, em 2002. Pouco mais de anos depois, a história dos dois virou cinema pelas mãos de Eduardo Albergaria em Nosso Sonho.

Claudinho e Buchecha são vividos por Lucas Penteado e Juan Paiva, respectivamente, mas quem narra a história é Buchecha da vida real, a partir do seu ponto de vista. Desde sua infância, quando conheceu Claudinho, até seu reencontro na adolescência depois de um episódio traumático com seus pais e, posteriormente, sua ascensão à fama e fim da carreira com a morte de Claudinho, vemos os bastidores do sucesso da dupla e os caminhos que os levaram até lá. Por considerar o ponto de vista de Buchecha, o foco é em suas relações pessoais, tanto com Claudinho quanto com seu pai, com quem sempre teve uma relação conturbada.

Conhecidos por cantar músicas românticas e músicas que falavam de sua realidade na periferia, os dois melhores amigos vieram de origens muito humildes. Claudinho, inclusive, abandonou a escola depois do ensino fundamental para trabalhar e poder contribuir financeiramente com a família. Buchecha também começou a trabalhar cedo para ajudar a mãe, Dona Etelma (Tatiana Tiburcio), que lidava constantemente com abusos de seu pai, Souza (Nando Cunha). Pai esse que sempre cobrou de Buchecha uma vida melhor, “quem tem talento não tem patrão”, mas da forma mais negativa possível, demonstrando sempre uma animosidade completamente injustificada em relação ao filho, mesmo quando o sucesso veio e ele se tornou, de fato, o patrão.

Nosso Sonho é uma grande produção (apesar de ter sentido que as cenas dos shows, especialmente do último show, poderiam ter sido mais bem trabalhadas), o elenco é afiado e a caracterização é boa. É impossível não se emocionar com a história que já nos é familiar, mas no que diz respeito ao roteiro, ele poderia ter se aprofundado mais na história como um todo e explorado mais as adversidades que ambos certamente enfrentaram em sua trajetória. É óbvio que dois meninos pobres da periferia do Rio de Janeiro não tiveram uma vida fácil para chegar onde chegaram – com uma casa própria (e sem rachaduras, como a mãe de Buchecha comenta no filme) e o carro dos sonhos, mas isso é surpreendentemente minimizado no filme, a ponto do título “Nosso Sonho” não fazer tanto sentido.

Todos os passos relacionados à carreira da dupla são passados com superficialidade e uma facilidade inesperada, até mesmo a criação da dupla é repentina. Segundos depois de se reencontrarem pela primeira vez em anos, Claudinho vira para Buchecha e diz “vamos formar uma dupla de MC’s”, sem nenhum contexto. Buchecha, que até esse momento era Beto (porque ninguém conhecia pronunciar Claucirlei Jovêncio, seu nome verdadeiro), reluta no primeiro momento, mas depois cede e tudo acontece sem obstáculos. Até eles estarem em cima do palco, em momento algum parecia que eles realmente tinham esse sonho de se tornarem tudo que acabaram se tornando.

O pai de Buchecha é o único conflito presente no filme, com exceção, é claro, do acidente. Problemático desde a infância de Buchecha, em que bebia o tempo todo, tentava tocar violão, arranjava brigas com a maior facilidade e afastava o filho sempre que podia. A mãe se separou, mas ele sempre voltava, pedindo dinheiro e atormentando sua vida a ponto de agredi-la fisicamente – Buchecha saiu de casa “fugido” do pai depois de defender sua mãe e ser ameaçado por ele. Mesmo com toda essa situação, Buchecha continuou tentando manter contato por diversas vezes antes de chegar ao seu limite. Claudinho, que é retratado figurativamente como uma espécie de anjo, insistia que ele deveria perdoar o pai, que todos merecem uma segunda – terceira – chance. Arcos de redenção costumam ser muito bem-vindos na ficção, mas pra que isso aconteça, e funcione, o personagem precisa sofrer uma transformação convincente que mude a direção da sua trajetória, coisa que não acontece no filme.

O filme é divertido e, como mencionado, interessante, mas se escora completamente no enorme carisma da dupla (a dos personagens e dos atores) e na nostalgia, no fato de se tratar de uma história real. As atitudes dos personagens e o desenvolvimento dos acontecimentos na narrativa só são críveis porque sabemos que, de fato, aconteceram. Talvez a decisão de se fazer um filme inteiramente “chapa branca” tenha sido tomada por se tratar de uma homenagem a Claudinho, coisa que o filme faz extremamente bem – é impossível sair do cinema sem acreditar que ele era mesmo um anjo, mas como uma obra de ficção, poderia ter explorado outros aspectos das vidas dos dois para a criação de algo mais concreto.

 

Por Júlia Rezende

7

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